Marco_2007 - page 89

Do rebanho ao
estilo
Nãohá ladode foradaglobalizaçãoe
do consumo. A despeito disto, parece
ser possível andarmos por este grande
shopping e produzirmos combinações
earranjosde fatoprópriose singulares.
Esta, aliás, éuma idéiabempróximaà
de como a psicanálise compreende a
formação do eu. Não teríamos caráter
ou personalidade inatos e naturais;
todos os nossos atributos pessoais são
dadosdesde fora, doambiente, através
de nossas várias identificações e refe-
rências ao longodavida.Mas, seoeu
é uma colcha de retalhos, precisamos
observar que todos os retalhos vêmde
fora, mas também que não há duas
colchas idênticas. Cada um acaba por
poder construir e se reconhecer como
ser singular resultantedos retalhos que
recolheu e da composição que fez.
Paraevocar umavezmais algumfilme
que ilustre esta dinâmica, penso num
estilo recorrente: aquele de um artista
quecomeça imitandoseus ídolosevai,
pouco a pouco, construindoum estilo
própriocomoem
Ray
.
Neste sentido, pensar uma cultura de
massadepoisde2000émaisanimador
doquepensar nelanos anos70ou80
doséculoXX.Então,asociedademassa
parecia realmente unilateral em seu
poderde influenciar todasaspessoasa
teremosmesmos gostos e seguiremas
mesmasmodas.Hoje, emboamedida
graçasaoacessoaomundoque temos
via internet, podemos conviver com
diversos filões de gostos e estéticas.
Mas,
Mas, mais do que isto, podemos de-
volvervianetnossaprópriacontribuição.
Alémdeblogs ecoisas afins, surgiuhá
poucos anos a possibilidade de alguns
jovensbaixaremumgamepelainternet,
baixaremtambémumeditordeimagens,
produzir um episódioou fase nova do
gameecolocá-losdevoltanarede.Com
toda a complexidade que o conceito
deautoriasofrenesseevento,émaravi-
lhosa a possibilidade de recebermos,
digerirmos edevolvermos aoambiente
nossacontribuição.Lembro-meaquide
produções cinematográficas recentes
produzidaspor“moleques”que ingres-
saram umamescla de referências: de
Tarantino aos autores de
Matrix
ouAs
BruxasdeSalem.
NÃOHÁ LADODE FORA,
MASPODEMOSEXISTIR
CRIATIVAMENTEDO LADO
DEDENTRO.
Emconclusãoaesteartigo,apenasreafir-
moqueestesmodelosnãosepretendem
exaustivossobreo tema,maspermitem
queseconjuguemdeterminantesmulti-
disciplinaresparaacompreensãodeum
tematãocomplexocomoéoconsumo.
O que é imprescindível é reconhecer
que o consumo seja determinado por
diversasordensderazãoeadificuldade
emcompreenderoprocessonãosedeve
ao fatodeeleser irracionalou inefável.
Por outro lado, sempre ébom lembrar
que o consumo é parte visceral de
nossa cultura, produzindo e sofrendo
todos os avanços e crises do mundo
contemporâneo.
ESTA,ALIÁS, ÉUMA IDÉIABEMPRÓXI-
MAÀDECOMOAPSICANÁLISECOM-
PREENDEA FORMAÇÃODO EU.
LEMBRO-ME AQUI DE PRODUÇÕES
CINEMATOGRÁFICAS RECENTES
PRODUZIDASPOR “MOLEQUES”QUE
INGRESSARAMUMAMESCLADEREFE-
RÊNCIAS, DETARANTINO ÀS BRUXAS
DESALEM.
PEDRO L. R. DESANTI
Psicanalista,doutoremPsicologia
pela PUC-SP,mestre em Filosofia
pelaUSP e professor na ESPM.
ES
PM
Foto: QuentinTarantino eUmaThurmanno cartaz deKill Bill Vol. I
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