 
          
            Revista da ESPM
          
        
        
          |maio/junhode 2012
        
        
          
            68
          
        
        
          ordem e progresso
        
        
          Segundo Aristóteles, o Estado, “como as plantas e
        
        
          os animais”, é um fim em si. Naquela época, a questão
        
        
          do Estado e seu fim apareciam como problema central
        
        
          através da história, sua transformação na visão socialista
        
        
          ou, simplesmente, sua eliminação segundo os anar-
        
        
          quistas. Foram as décadas anteriores à crise de 2008,
        
        
          particularmente a década de 1980, que fizeram surgir
        
        
          o discurso da redução ou afastamento do Estado nos
        
        
          assuntos econômicos.
        
        
          Voltando às origens do Estado, sua missão política
        
        
          é difícil de ser determinada, por sua grande complexi-
        
        
          dade, sobretudo no que diz respeito à administração
        
        
          das instituições. Desde o nascimento do Estado Mo-
        
        
          derno, com Maquiavel, sua importância concentra-
        
        
          se na coesão territorial. A importância situa-se em
        
        
          sua geopolítica, concretamente em sua população e
        
        
          coerência jurídica, onde problemas sociológicos e
        
        
          ideológicos se misturam. Por último, temos de con-
        
        
          siderar a relação divina (Os 10 Mandamentos), como
        
        
          o destino do gênero humano.
        
        
          O homem não é um animal social. Polemizando com
        
        
          a tradicional tese aristotélica, Thomas Hobbes, autor de
        
        
          
            Leviatã
          
        
        
          (Ícone Editora), afirma que os homens não são
        
        
          abelhas ou formigas e que via na sociedade o resultado
        
        
          de um instinto primordial. Hobbes sustenta que, no
        
        
          gênero humano, diferentemente do animal, não existe
        
        
          sociabilidade instintiva, como mostra Norberto Bobbio
        
        
          no livro
        
        
          
            Thomas Hobbes
          
        
        
          (Editora Campus).
        
        
          No começo do capítuloXIII do livro
        
        
          
            Leviatã
          
        
        
          , Hobbes diz
        
        
          que os homens são iguais em força física e, no segundo
        
        
          parágrafo, que tambémo são no espírito. Note-se que não
        
        
          se trata de identidade, de igualdade exata. É claro que
        
        
          uns sãomais fortes que outros, fisicamente. Mas isso não
        
        
          impede que o mais fraco mate o mais forte. A diferença
        
        
          de força é menor ou menos relevante por seus efeitos do
        
        
          que a razoável igualdade que há entre as pessoas nesse
        
        
          tocante. Igualdade e diferença assim se medem por seus
        
        
          efeitos, ou melhor, por seu efeito no tocante a matar
        
        
          ou ser morto, como explica Renato Janine Ribeiro, no
        
        
          capítulo “Medo e esperança em Hobbes”, do livro
        
        
          
            A crise
          
        
        
          
            do Estado-nação
          
        
        
          , organizado por Adauto Novaes (Editora
        
        
          Civilização Brasileira).
        
        
          Entre os indivíduos não existe um amor natural,
        
        
          mas somente uma explosiva mistura de temor e ne-
        
        
          cessidade recíprocos que, se não fosse disciplinada
        
        
          pelo Estado, originaria uma incontrolável sucessão
        
        
          de violência e excessos. Além do medo mais visível,
        
        
          que é o de um a outro no estado de natureza, também
        
        
          é preciso tratar do medo que se tem do soberano e
        
        
          que se expressa como
        
        
          
            awe
          
        
        
          , não como
        
        
          
            fear. Awe
          
        
        
          é cor-
        
        
          retamente traduzido como “reverente temor”, e
        
        
          
            keep
          
        
        
          
            in awe
          
        
        
          significa “manter em respeito” (da palavra
        
        
          
            awe
          
        
        
          ,
        
        
          praticamente todas se referem ao temor em face de um
        
        
          poder superior e comum a todos, que seria o Estado –
        
        
          como é citado por Ribeiro, em “Medo e esperança em
        
        
          Hobbes”). Não é, portanto, o mesmo medo recíproco
        
        
          e ilimitado que temos, todos de todos, no estado e
        
        
          natureza, mas um medo respeitoso – mais respeito
        
        
          talvez que medo –, que se sente em relação ao superior
        
        
          que tenha título a mandar em nós.
        
        
          Precisamente porque o contrato de fundação de toda
        
        
          sociedade humana tem caráter artificial, faz-se neces-
        
        
          sário que o Estado seja absoluto (como lei fundamental),
        
        
          soberano e poderoso, capaz de suprimir qualquer ten-
        
        
          tativa de fazer prevalecer o interesse pessoal. Somente
        
        
          reconhecendo todos como súditos de uma autoridade
        
        
          externa (o Estado), os homens podemsuprimir qualquer
        
        
          forma de antagonismo recíproco que, segundo Hobbes,
        
        
          predominaria se os súditos se transformassem em ci-
        
        
          dadãos, adquirindo o direito de julgar a coisa pública.
        
        
          O próprio Hobbes percebeu uma das grandes razões
        
        
          para notar que uma parte significativa da opinião
        
        
          cultivada de seu tempo, aquela que ele acusou de se
        
        
          embeber nos clássicos, reconhecia a uma assembleia
        
        
          soberana poderes que jamais atribuiria, de bom grado,
        
        
          a um príncipe, embora igualmente soberano. E teve
        
        
          ele toda a razão ao lembrar que, se a palavra-chave é
        
        
          soberania, os poderes de uma assembleia democrática,
        
        
          de um senado aristocrático ou de um rei devem ser os
        
        
          mesmos (Ribeiro, Op. cit. p.151-152).
        
        
          Entreos indivíduosnãoexisteumamor
        
        
          natural,massomenteumaexplosiva
        
        
          misturade temor enecessidade
        
        
          recíprocosque, senão fossedisciplinada
        
        
          peloEstado, originariauma incontrolável
        
        
          sucessãodeviolênciaeexcessos