Cecília
Mattoso
27
M A R Ç O
/
A B R I L
D E
2 0 0 6 – R E V I S T A D A E S PM
NILDA
Prestações
➝
gravidez
➝
desemprego
➝
inadimplência
➝
aumento
da família
➝
novo emprego com redução de renda
➝
“nome sujo”.
JUCIARA
Empréstimo em banco para obra
➝
desemprego
➝
agiota
➝
pagamento da dívida.
MARIA
Empréstimo em banco para conserto da Kombi
➝
roubo da Kombi
➝
perda do ganha-pão
➝
agiota
➝
inadimplência
➝
ameaça de morte
➝
venda da casa
➝
volta à família (NE).
MARIO
Emergência (batida de carro)
➝
ameaça de morte
➝
empréstimo
em financeira para pagar prejuízo
➝
pagamento da dívida.
JUVENAL
Doença
➝
suspensão de renda
➝
uso de reservas.
ROSANGELA
Morte por assassinato
➝
depressão
➝
não-pagamento de contas
➝
“nome sujo”.
MARLENE
Parente envolvido com tráfico
➝
falsificação de cheque
➝
inadimplência
➝
“nome sujo”
➝
venda da lanchonete
➝
perda da
atividade remunerada.
este índice baixo por ela ter como
público-alvo os pobres? Os
levantamentos bibliográfico e de
campo mostraram que a empresa
aprendeu a lidar com esta classe
social e este conhecimento lhe
possibilitou administrar melhor o
riscodonão-pagamento. Por exem-
plo, a Casas Bahia treina seus ven-
dedores a não vender quando
percebem que existe “empréstimo
de nome”, porque ela sabe que a
segunda maior causa de inadim-
plência é justamente o empréstimo
de nome. A primeira causa é o
desemprego.
Uma vez que a pesquisa foi explo-
ratória e qualitativa, não se pode
fazer inferências para o resto da
população. Entretanto, os dados da
Febraban apontam um aumento da
inadimplência nas classes mais
baixas, oque corrobora apesquisa,
onde os entrevistados falavam com
muita naturalidade sobre o fato de
estarem com o “nome sujo”. Nin-
guém ficava com vergonha ao falar
sobre sua inadimplência. Talvez
esta naturalidade se dê por ser um
fato muito comum nesta classe. É
natural que estas pessoas se en-
contrem inadimplentes, pois a ren-
da delas oscila muito e o desem-
prego é recorrente. Por outro lado,
oque sepode falaremdefesadestas
pessoas é que elas se mostraram
bastante conscientes ao falar de
consumo e até bastante comedidas
aonarrarem seusgastos.Nãohouve
relatos de pessoas que se endivi-
daramporconsumiremmaisdoque
podiam pagar. Elas faziam sempre
oconfrontodovalor das prestações
versus
salário e tinham aversão a
empréstimos. Porém, com uma si-
tuação financeira bastante vul-
nerável, a chance da inadimplên-
cia se torna muito alta.
A idéia de que os pobres se endivi-
dammuitonão encontrou respaldo
na pesquisa.Oque acontece é que
a falta de reservas e recursos é
freqüente.Osempréstimos tomados
em financeiras se davam devido a
ocorrênciascomomorte, acidentes,
ou, em alguns casos mais raros,
oportunidades inesperadas como a
possibilidade de comprar um
terreno ou casa. As pessoas que
pegavam os empréstimos tinham
plena consciência de que os juros
que estavam pagando erammuito
altos, mas diziam não ter outra op-
ção, sendoqueaalternativaexistente
era o agiota, cujas taxas eram altís-
simas, havendo até risco de vida.
AFigura1apresentaalgumasdessas
ocorrências, extraídas dos relatos.
Como se pode observar, certos
eventos dão início a uma cadeia de
causalidade perversa, que leva ine-
FIGURA 1 – SEQÜÊNCIADEEVENTOS
ASSOCIADOSAPROBLEMASFINANCEIROS