Julho_2006 - page 116

grandes metas narrativas, como uma
crítica aosexcessos damodernidade
e - a partir daí-uma liberação para
que pudéssemos levar com mais
espírito científico - no melhor sen–
tido dessa idéia - as proposições do
homem, as proposições da própria
ciência. Se a gente mantiver a
crítica ao excesso que se comete em
relação ao próprio conceito, talvez
ele possa até ser recuperado, como
a ferramenta que foi para apontar
os abusos de uma ciência que
queria, talvez, ocupar o lugar de
uma religião banida. Gosto de um
texto do Rouanet, onde ele faz uma
recuperação histórica do conceito
da pós-modernidade e apresenta
uma idéia - inspirada inclusive no
Merchior: talvez seja omomento da
gente pensar - não importa se chama–
mos de pós-modernidade, moderni–
dade tardia, o que seja - quais são
os ideais da modernidade que ainda
nos interessam..
GRACIOS O
- Talvez seja essa uma
forma produtiva de conduzirmos a
nossa análise, se aquilo que chama–
mos demodernidade se distingue ou
não das características da sociedade
como a vemos hoje. Ela continua fiel
ao princípio concreto, positivo da
modernidade? Ou é diferente?
VINÍCIUS
- Acho que uma coisa
é falar de um projeto de moderni–
dade, outra coisa, de práticas sociais
que de fato traduzam o projeto da
modernidade. Eu concordo com
Latour, em que, efetivamente, nunca
fomos modernos. Tivemos um pro–
jeto de modernidade que nunca foi
cumprido. E, mesmo nesse projeto,
foram cometidos excessos. Acho
que a crítica da pós-modernidade
dos franceses está l igada a um
projeto de modernidade que talvez
tenha sido excessivo. E talvez pos–
samos rever a questão da angústia,
que o professor Gracioso expôs.
A angústia, a que Kierkegaard se
refere, por exemplo, traduz um es–
tado da condição humana ancorada
no fluido da própria cultura - que
são as amarras não naturais da
nossa existência - e isso dá um ím–
peto à transcendência e resulta em
produtos maravilhosos como, por
exemplo, a arte, a religião, filoso–
fia, a própria ciência. A angústia,
então, não é negativa, uma espécie
de neurose que oprime o humano a
partir da modernidade; quando se
frustra, abandonando um projeto de
religiosidade, ou se torna crítico em
relação às suas utopias e ilusões. A
angústia tem de ser pensada como
um ímpeto, ummovimentocontínuo
à transcendência. Pode-se positivar
essa experiência, como se podem
positivar algumas experiências da
contemporaneidade pós-moderna
que vêm sendo criticadas. Quando
o professor Gracioso fala do uso de
novas tecnologias, como
second
life
ou os
games
-, isso pode ser
entendido, não como fuga da rea–
lidade, mas como um modo novo
de representar a existência. Nesse
sentido, esses meios não se dife–
renciam de experiências artísticas e
- do mesmo modo - não dizemos
que o artista quer fugir da realidade.
Em quemedida a realidade do artista
é válida, e a do avatar - que está
no
second life
representando suas
práticas sociais e dando margens às
suas fantasias - não é. A positividade
da angústia, como um movimento
de transcendência intrínseco ao
humano, produz, eventualmente,
excessos, patologias, vícios, destrui–
ções; mas, em outros momentos,
resulta em arte, filosofia, ciência e
também
second life
e
games.
JR
- É boa essa. Quando oVinícius
se refere a atividades como
games
e
second life
como arte, podemos,
também, ver a coisa como uma sig–
nificativa mudança midiática. Não
devemos esquecer que o artista,
tradicionalmente, tinha acesso à sua
mídia: as telas para as suas pinturas,
os apetrechos para sua escultura,
etc. Mas o povão não tinha. O povo
plantava beringela, cuidava das
vacas, arava a terra.. A tecnologia
trouxe esses meios para o alcance de
um número enorme de pessoas que
nunca se haviammanifestado antes.
Gostaria de ouvir o Percival...
GRACIOS O
- Antes que o Percival
pegue a deixa: o
second life
e os
games levam milhões de pessoas
a entreter-se, durante horas, diante
de jogos que simulam a realidade
de uma forma que as atrai. Nunca
houve isso antes: este foco na
massa e em formas de nos distrair,
por um momento ao menos, do
mundo real?
PERCIVAL
-Acho que entendi meta–
de de tudo o que vocês disseram..
Não pertenço aomundo acadêmico,
do pensamento teórico; sou mais
da "mão na massa". Mas estou
aprendendo muito. Acho que o que »
1...,106,107,108,109,110,111,112,113,114,115 117,118,119,120,121,122,123,124,125,...126
Powered by FlippingBook