Julho_2006 - page 99

na televisão e nas mídias digitais.
Retomando as teses do antropólogo
Morin, notamos que neste plano da
produção imagética somos transpor–
tados para um momento mágico,
no qual a posse da representação
equivaleria - por contiguidade - à
posse do representado.
Não por acaso, desenvolvemos re–
lações da mais densa afetividade
com nossos aparelhos de enunciação
imagética: alguns preferem cumpri–
mentar suas tevês, outros escolhem se
emocionar com imagens capturadas
por câmeras digitais. Como apontado
pelo artista e teórico americano Tom
Sherman, em um delicioso artigo
intitulado "Machines R Us...", cer-
camo-nos de equipamentos eletrôni–
cos como bebês desesperadamente
carentes, ávidos pela ampliação de
nossa zona de conforto. Bebês domi–
nadores e antropomórficos, diga-se de
passagem, que carregam seus objetos
tecnológicos como senhoras elegantes
conduzem seus perfumados "lulus".
Mais fiéis doque cães, mais humani–
zadas que qualquer humano, tão
amáveis quanto o mais prestimoso
companheiro, mais reais que o mais
fascinante "amigo imaginário", mais
disponíveis que qualquer analista,
assim seriam as máquinas, aquelas
mesmas que, ao chamarmos de nos–
sas, também agregam valor àquilo
que chamamos de nós mesmos.
Para Sherman, a relação de con–
fiabilidade que se estabelece com
o universo maquínico permi te
uma sugestiva redefinição da di–
cotomia público/privado. Naquela
que autores contemporâneos vêm
definindo como uma cultura da
conectividade, cria-se uma relação
de dependência com as máquinas,
das quais se necessitaria tanto para
olhar para aqui lo que nos é ex–
terno quanto para o nosso próprio
interior.
Em um tal contexto, não é de es–
tranhar o fascínio experimentado
ao nos tornarmos espectadores de
imagens geradas através do regis–
tro obtido por câmeras ocultas. O
inelutável sucesso dos flagrantes
exibidos em programas televisivos
apenas confirma e torna exponen–
cial tal encanto. É também digno de
nota o prazer com que proprietários
de telefones celulares portadores
de câmera fotográfica registram,
a seu bel prazer e de modo "des–
pistado", pessoas que as cercam,
sejam estas suas amigas ou mesmo
absolutamente desconhec idas.
Vivendo da perversão sugerida
por esta limiaridade, encontramos
igualmente os paparazzi, sequiosos
por transformar em imagem pública
(on-line) a intimidade off-line de
celebridades.
São máquinas que nos acompa–
nham, são máquinas que nos pro–
tegem de nós e dos outros, são
máquinas que nos colocam em
relação conosco e com os outros,
consentida ou compulsoriamente e,
o que agora nos interessa, são má-
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