Julho_2006 - page 98

limites simbólicos (da privacidade,
por exemplo) ou por limites espa–
ciais, repercutem no modo como
construímos nossa identidade e
reconhecemos a diferença. O im–
perativo da visualização, se pode
inegavelmente dar margem a encan–
tadoras produções imagéticas, pode
também incidir perniciosamente no
modo como concretamente vivemos
nossas vidas, percebemos o mundo
e nele nos inserimos.
A denúncia que acompanha vários
dos discursos sobre o pós-moderno,
quando estes se referem às imagens,
é contundente. Sociedades que
atribuem às imagens o caráter de
atestados de existência convidam,
necessariamente, cada um de nós
a nos transformar em imagens
espetacularmente visíveis. Como
oportunamente ressaltado pelo
pesquisador brasileiro Norval Baitel-
lo Junior, mais do que devoradores e
colecionadores de imagens somos,
hoje, por elas devorados, o grau
máximo da iconofagia, tese longa-
mente estudada pelo autor.
Outro elemento a compor esse
cenário seria a progressiva obl i–
teração do espaço público por
imagens públicas. Assim, cidadãos
comuns, estrelas da mídia e políti–
cos, cada vez mais midiáticos, todos
se digladiariam nesta arena de visu–
alidade, de modo a melhor estru–
turar sua estratégia de visibilidade e
nem sempre a aprimorar princípios
humanistas e humanizadores de
convivência. Tratar-se-ia, enfim, da
transformação do social em fato de
imagem. Aprofundando um pouco
mais este componente um tanto
perverso, indica-se que em cidades
que passam a ser vividas como se
fossem umgrande cinema cotidiano,
o "outro", facilmente, pode ser con–
vertido em uma imagem que passa,
tambémperdendo sua substância.
Na abordagem de Zygmunt Bau-
mann, sociólogo polonês cujos
livros rapidamente se tornaram um
sucesso internacional, a liquefação
dos vínculos potencializada pelo
advento da proximidade virtual
- e, acrescentaríamos, pela pro–
fusão visual -, se não significa a
supressão do contato, ocasiona o
estabelecimento de contratos de
relacionamento essencialmente
fluídos. As conexões são muitas,
mas também muitíssimo breves. O
rol de interações éenorme, mas por
vezes pode ser difícil perceber estes
outros com os quais nos conectamos
em sua materialidade fenomênica e
em sua complexidade e densidade
subjetiva.
Edgar Mor in, em uma belíssima
análise sobre o encanto que cerca
as imagens, postula que nada nos é
mais sedutor do que a transformação
do banal e do comezinho em regis–
tro imagético. Um duplo sentido
cerca a "impressão de realidade"
desta forma obtida, seja na fotogra–
fia, no cinema e, mais recentemente,»
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