Janeiro_2005 - page 62

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J A N E I RO
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F E V E R E I RO
D E
2005–REV I STA DA ESPM
Avelar
Vasconcelos
feitodeproduto?Cadaprodutonão
necessita de uma
expertise
própria;
cada produto não tem as suas in-
diossincrasias? Tudo bem, dirão,
faremos um “Comitê de Marcas”.
Mas, nesseprocesso, cadavezmais
vamos indo na direção do “escor-
regão semântico”, erigindo o mar-
keting em técnica cada vez mais
refinada e nos afastando da sua
razãomesma de ser, que é vender.
ASFACULDADES
DECOMUNICAÇÃO
ENTRAMEMCENA
Claro, dirão, que é possível conci-
liar tudo isso em uma mesma pes-
soa. E de fato é. Mas...
E aí vem um outro paradoxo. A
complexidade cada vez maior do
mercado, como já mencionado
acima, que trouxe consigo um
grande número de produtos e
marcas, geroupor sua vez aneces-
sidade de se termais “gestores” de
produto ou marcas. As Univer-
sidades, por sua vez, também per-
ceberam a existência desse novo
“mercado” e lançaram toneladas
de Faculdades de Comunicação
pelo Brasil afora e no mundo
também, com a qualidade nem
sempre à altura das reais neces-
sidades. E então começaram a
ensinar as “técnicas” demarketing
aos seus alunos, técnicas essas que
fazem parte do recheio das
inúmeras escolas decomunicação.
Aparentementeatéaqui, tudobem.
Mas acontece que, mais uma vez,
involuntariamente, caímosdenovo
nomeu famoso“escorregão semân-
tico”. Ou seja, o marketing torna-
se, assim, parte de um todomaior,
a comunicação (quando o inverso
deveria ocorrer), apresentando
uma visão muito mais técnica e
qualitativa e muito pouco de ne-
gócio e quantitativa. Conseqüên-
cia disso? Nas minhas andanças
pelo país fazendo palestras, quando
explico aos estudantes o que é
verdadeiramente o marketing, vejo
os olhos esbugalhados de surpresa,
quando descobrem o lado menos
charmoso do marketing, quando
percebem o seu ladomais
hard,
do
qual nemdesconfiavam.Mesmo se,
de alguma maneira os professores
“deram” essamatéria, comomanda
o figurino. Mas a “percepção se-
letiva” de cada um optou pela par-
temais “interessante” domarketing,
evitando “misturar-se” com essas
coisas mais terrenas e “triviais” do
marketing; o que gerará, mais a-
diante, ummarketing incompleto e
ineficaz.
E o que vai acontecer no mercado
com esse pessoal? Vai transformar o
marketingno seubezerrodeouro.Vai
transformaromarketingcomoum fim
em si mesmo (lembram-se das agên-
cias?), vai preparar orçamentos de
marketing de maneira bem “cientí-
fica”, vai alocar os recursos de mar-
keting (para quemesmo?) para o ano
seguinte, de maneira bem simétrica,
mês amês, e isso 15meses antes de
o ano em causa terminar (como se a
realidade obedecesse a esses “pla-
nejamentos estratégicos”). Tudo isso
pode parecer exagerado ou carica-
tura. Infelizmente é a realidade que
se vê hoje. Não é de estranhar, por-
tanto, que se comece a perceber que
não é só a propaganda que está em
crise. Omarketing também.
OMARKETING
É LOTEADO
Infelizmente, oproblemanão se re-
sume a isso. O marketing, trans-
formadoemmeio, quenãoalcança
os resultados esperados pelos acio-
nistas (sim, eles existem, o marke-
ting não vive sozinho), passa a ser
loteado nas empresas. A função de
gerente de produto, que no início
era umpequenodiretor, passa a ser
cada vez mais encurralada, redu-
zida, oque, num terrível círculo vi-
cioso, contribui ainda mais para a
sua ineficácia, para agravar a sua
crise. Restampoucas atribuições ao
sobrevivente e valente gerente de
produto.
Philip Kotler, sintomaticamente,
acaboude lançarum livronoBrasil
1
sobre os
Dez pecados mortais do
marketing
, em que, em um certo
trecho, resume muito bem esse
esquartejamento das funções do
marketing:
“Ocorre que hoje é cada vez mais
comumomarketingnão ser respon-
sável por todo esse processo, que é
conduzido por uma mistura de
profissionais de marketing, estrate-
gistas, representantes da área finan-
ceira e da operação. De alguma
forma, quandoumnovoprodutoou
serviço é criado cabe aomarketing
exercer a suaverdadeiramissãoaos
olhos de outros órgãos da empresa:
promoção e vendas. Ou seja, em
vez de quatro, amaior parte da ati-
vidade fica reduzida a um único
P
(promoção). Como a empresa aca-
ba desenvolvendo um produto que
não vende, a tarefa principal do
marketing passa a ser a de limpar
1.
KOTLER
, Philip. “Dez pecados mortais do marketing” – Editora Campus, 2004.
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