Julho_2006 - page 68

Berlusconi, na minha opinião, o
primeiro homem político global
puramente brasilianizado. Há mui–
tas explicações simplistas para Ber–
lusconi, sobretudo na França, onde
ninguém nunca o entendeu; diziam
que se tratava de um manipulador,
um homem que era proprietário de
redes de TV, portanto influenciava
todo mundo e - graças à televisão
-tomou o poder. Só que não é tão
simples. Se se observarem os da–
dos eleitorais na Itália, Berlusconi
venceu as eleições de 94 quando
só tinha uma parte das televisões
do seu lado. Depois de tornar-se
primeiro-ministro é que adquiriu
o controle dos meios de comuni–
cação e da TV italiana. No entanto,
em 1996 ele perde as eleições e
também a televisão estatal. Quando
retorna ao poder, em 2000 não mais
detém o controle total da mídia, e
ainda assim ganha as eleições. Ele
ainda governa, tem o poder, tem
o controle da mídia, mas, no ano
passado, perdeu as eleições. Seria
redutivo dizer que, por causa da TV
e fazendo manipulações aqui e ali,
as coisas vão andar de algummodo.
Berlusconi é mais do que isso: em
primeiro lugar, é uma estrela, é o
carnaval ideal. Como homem mais
rico da Itália, é o consumidor ideal:
possui sete villas, só na Sardenha, e
desloca-se de uma para outra, em
puro hedonismo. Todo italiano olha
para Berlusconi e sonha - porque
ele compra tudo que quer, pode
possuir tudo, até o futebol, pois é o
dono do clube Mi lan. Não se trata
mais de um homem político, mas
tem toda a dimensão da arena; é
uma estrela do carnaval, nada mais
e nada menos. Assim mesmo, na
sua plataforma política, vai insistir
muito na insegurança (embora isso
seja menos percebido no exterior,
por ser menos folclórico, menos
interessante). Fala da luta contra
o crime, do policiamento urbano,
promove uma verdadeira psicose
da insegurança, antes mesmo do
dia 11 de setembro; após o 11 de
setembro, torna-se aliado de Bush,
é o homem que vai ao Iraque... Eis
os dois pólos - o pólo do carnaval
e o pólo da segurança (e, portanto,
da insegurança), e eu, como homem
político, lhes forneço uma solução
para isso.
Isso se generaliza. Sarkozy não é
mais apenas um político francês
- mas a evolução disso. Ele não faz
parte da clássica elite tecnocrática
francesa, não cursou a ENA (Escola
Nacional de Administração), nem
nenhuma das faculdades de prestí–
gio. É alguém que chega ao poder
dizendo: eu não sou essa coisa que
está aí. A velha elite racional - da
qual falávamos - não tem nada a ver
com Sarkozy. Sarkozy é a evolução
sob forma de estrela. Continua a ser
um político, mas conseguiu a sua
transmutação em estrela. Ele tem
mais amigos entre gente do show
business do que outros políticos.
Após as eleições, ele esteve a bordo
do iate do seu amigo bilionário,
Vincent Bolloré, e os jornais na
França ficaram escandalizados. Não
entenderam nada, porque o público
ama essa qualidade das estrelas,
ama os iates e as representações
de tudo isso.
Ao mesmo tempo, Sarkozy tran–
sita pelo pólo da segurança:
tough
against
crime,
tough
against
the
causes of crime
(foi o Blair quem
lançou isso, mesmo sendo um
homem de esquerda). É interes–
sante observar essa c l i vagem,
confer ida dentro da mais pura
brasilianização.
Na verdade, não tenho nenhuma
conclusão a oferecer. Gostar ia
de poder discutir mais um pouco
as conseqüências publicitárias
e comunicacionais de tudo isso.
Como minha formação é mais
política, vejo muito claramente
as conseqüências políticas desses
fenômenos todos.
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