Janeiro_2005 - page 50

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J A N E I RO
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F E V E R E I RO
D E
2005–REV I STA DA ESPM
MaristelaGuimarães
André
Acontecequeessadinâmica,provo-
cadapelas tensõesentreasmarchas
e contramarchas das tendências,
acabapor anularosdiferentesgraus
de satisfação das necessidades
humanas, porque dissolve os con-
teúdos reais (prazerosos ou não),
que se ligam,mais intimamente, às
experiências de vidados indivídu-
os.Ou seja, quando fatores contin-
gentes sãoaceitos comoaprincipal
força-motriz das tendências e, con-
seqüentemente, os indivíduos se
deixam levar pelanaturezaefêmera
delas, a identificação dos vetores
fundamentais na dinâmica da vida
diária fica comprometida e, desse
modo,apercepçãodascontradições
reais também ficaafetada, tornando
mais difícil a compreensão dos fa-
tos imediatos e, assim, o acesso ao
desejo e, portanto, à subjetividade.
Quando o desejo é deslocado do
seu centro, toda e qualquer ativi-
dade que afaste a sensação de dor
é, por essa mesma razão, um ca-
minho franqueadopara oprazer.O
consumo, comodiz a canção, con-
verte-se na longa e esvoaçante
estrada que leva os indivíduos até
a porta da felicidade (
the long and
winding road that leadsme to your
door
1
). No ato de consumir, iden-
tificadoentreos extremosdoexces-
so e da carência (de bens e ser-
viços), transcende a racionalidade
mundana; cada indivíduo encontra
um nexo aplicável à sua condição
de carência ou privilégio na socie-
dade de mercado, simplesmente
porque,por intermédiodoconsumo
tem acesso a uma forma de inter-
locução social.
Noconsumo, cada indivíduo, liberto
das obrigações percebe que pode
estabelecer para si as regras que
acreditava herdadas de outras gera-
ções.Diantedaspequenas egrandes
coisas da vida, permite-se desejar os
produtos (bens e serviços) que mais
o atraem; daí a substituição do “so-
nhoda casa própria”, paradigmático
de um certo grupo social, pelo “so-
nhodeconsumo”dosartigosde luxo
ou de grifes.
Esse desejo, que está presente em
todosos lugares,nosrelacionamentos,
no trabalho,nosclubeseassociações,
nos ambientes de lazer, e, expresso
nas artimanhas do jogo do consumo,
torna-seuma formasimulada,passível
de percepção, dependendo dos
modos de assimilação e compre-
ensão dos contornos de sua veros-
similhança com a individualidade.
Em1973, IlanSpecht, uma jovem redatoradaagênciaMcCann-
Erikson, ganhouprojeção aopropor um comercial para a L´Oréal
comoslogan: “porqueeumereço”.
1. The long and winding road – Lennon &McCartney – 1970)
Foto: Corbis/Stockphotos
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