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SETEMBRO
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OUTUBRO
DE
2007 – R E V I S T A D A E S P M
mente,oBrasil reconheceuaChina,
como economia de mercado, e
–com isso-abrimosmãodealguns
instrumentos de defesa comercial,
que deveríamos ter mantido por
algum tempo. Só que também isso
não é solução. Estou preocupado,
porque agora mesmo, no Sul, há
setores –comoodecalçados –mo-
mentaneamenteprotegidosporbar-
reirascontraaChina, quenãoestão
fazendo o dever de casa, para que,
quando as barreiras caírem – pelas
regras da OMC –, essas empresas
possam competir e prosperar.
São esses os desafios que o Brasil
enfrenta. Apesar de todos os pe-
sares, seolharmosnumaperspectiva
mais ampla, conseguimos algumas
“viradas” (a expressão em inglês
é mais expressiva:
turning points
).
Vou enumerar alguns. Em primeiro
lugar, a democracia. É importante a
consolidação de um regime demo-
cráticonoBrasil.AChinaparece ter
a “vantagem” de, com um regime
autoritário, poder manejar melhor
a economia, distribuir os recursos.
Mas a democracia é um ponto im-
portante que o Brasil tem. Outro é
a inflação. O fato de estarmos com
uma inflação de menos de quatro
por cento é extraordinário, diante
das décadas de crises monetárias
no Brasil. Outro aspecto foi a mu-
dança do papel do Estado como
empreendedor, o processo de pri-
vatização, que, infelizmente, vejo
questionado, atrapalhado de novo,
poramarras ideológicas...Mascreio
queoMarconini falarádissodepois.
OMinistro faloudascrisescambiais,
que vivemos tanto tempo, e das
quais estamos momentaneamente
livres, namedida emque a conjun-
tura internacionalnosé favorável–a
preocupação é até que ponto isso
vai durar. A Dívida Externa, outra
preocupação obsessiva, superada
peloacúmulode reservas.Aauto-su-
ficiênciaempetróleo,umaconquista
muito importante e que vem sendo
também favorecida pelo êxito do
programadoEtanol.A revoluçãodo
agribusinessbrasileiroque tempuxa-
do um desempenho extraordinário
do país no plano internacional (e
queéquestionada também,pormo-
tivos ideológicos, dentrodopróprio
Governo). A abertura do Brasil, a
diminuição de nossas tarifas que,
eu espero possam diminuir ainda
mais,medianteo tardioengajamento
do Brasil em acordos bilaterais que
realmente nos abrammercado.
Como mostrou o Ministro Delfim
Neto, isso preocupa. Os espaços
estão-se reduzindo, na medida em
que o comércio intra-lócus cresce
na União Européia em expansão e,
numa Ásia que mais e mais vai se
integrando– jánãomaiscomo Japão
e sim com aChina como omotor. E
vejo com preocupação a prioridade
que a União Européia dá à idéia de
umacordode livrecomérciocomos
países da Ásia, e não com oMerco-
sul, em situaçãodedescrédito–hoje
particularmentediantedaperspectiva
daentradadaVenezueladeChávez...
Outramudança importantepassapor
investir no Exterior – como estamos
vendonocasodaBolívia,ondesomos
os“novosgringos”eemalgunspaíses
daregião.FuiembaixadornoEquador,
de1985a1988,quandocomeçavam
as primeiras incursões de empresas
brasileiras, a Petrobras, as grandes
construtoras e outras empresas com
planos internacionais.
Em suma, minha mensagem é
simples: de alguma forma, nós
estamos em posição mais forte do
que antes; o que me preocupa é
o conformismo com esse relativo
conforto econômico, que – como
bem mostrou o Ministro Delfim
Neto – nos foi muitomais dado do
queconquistadopor nós. Euquero
terminar com uma frase que bem
simboliza o que é a mentalidade
chinesa em relação ao mundo
da globalização. Enquanto aqui
ainda temos hesitações, temores,
atitudes defensivas, a China já fez
uma opção de engajamento, para
valer nesse mundo que cresce tão
dinamicamente, que luta caleido-
scopicamente. Na época de Mao
TseTung, durante aRevoluçãoCul-
tural, intelectuais, estudantes, fun-
cionários eram obrigados a ir para
o interior do país. Nos meus anos
em Pequim, conheci pessoas que
passaram anos de sua vida lavando
cavalosou lavrandoa terra, fazendo
trabalhoshumildes.Aexpressãoque
seusavanaépoca,emchinês,eraxia
hai le, que quer dizer “baixar para
ocampo”, duas palavras diferentes,
dois tons diferentes significando
ir para o campo, ir para o interior.
Hoje, na China, metaforicamente,
se diz a mesma coisa, como lema,
comomotopara essanovapostura,
xia hai le - hai em chinês é mar,
é o oceano, metaforicamente é o
mundoexterior, éaglobalização. Se
os senhores me permitem, gostaria
de encerrar dando este conselho
aos senhoresque sãopromotoresde
negócios, quevãoajudar a inserir o
Brasil noplano internacional, nessa
língua e nessa expressão que agora
os senhores conhecem tão bem:
xia hai le.
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