 
          
            55
          
        
        
          M A I O
        
        
          /
        
        
          J U N H O
        
        
          D E
        
        
          2 0 0 5 – R E V I S T A D A E S PM
        
        
          Alexandre
        
        
          Mathias
        
        
          eMarco
        
        
          Dalpozzo
        
        
          Quandoentrei,nãosabiabemoque
        
        
          falar. Falo? Perguntei-me. Por fim
        
        
          entrei sócomo silênciodospassos.
        
        
          Eleestavaempéolhandoosquadros
        
        
          perto da janela, em frente a um
        
        
          quadro exótico, lembrança sei lá eu
        
        
          de qual viagem, ou quem sabe até
        
        
          fruto de uma premiação ou reco-
        
        
          nhecimento. Os quadros eram glo-
        
        
          bais. Representavammuitos e varia-
        
        
          dos lugares domundo, eram os fru-
        
        
          tos de uma história profissional que
        
        
          hámuito tempomisturava-se com a
        
        
          biografia.Masnadadissoparecia fa-
        
        
          zerdiferençadiantedarealidade. José
        
        
          Carlos tinhachegadoaoúltimodia.
        
        
          Recebi o convite de um almoçode
        
        
          trabalhoháalguns dias,mas não ti-
        
        
          nhaaindaaclarapercepçãodeque
        
        
          aqueleera–paraele–oúltimodia.
        
        
          Agora ele entrava silenciosamente
        
        
          naquela sala, ondepor várias vezes
        
        
          sentira frio na barriga antes de cru-
        
        
          zar aquelaporta. JoãoCarlosestava
        
        
          –agora–em frenteaosquadrosde-
        
        
          le,procurandoemcadaumascores
        
        
          da sua existência. Não pensei em
        
        
          nada.Aquantidadeea intensidade
        
        
          domomento exigiammáxima con-
        
        
          centração. Era necessário ler e en-
        
        
          tender aquele momento. Mais: era
        
        
          importante perceber o sentido que
        
        
          aquilo fazia para ele. Nós, parcei-
        
        
          ros estratégicos de RH, não somos
        
        
          chamados para falar, opinar, agir,
        
        
          mas – naqueles momentos – esta-
        
        
          mosalipara receber, escutar, supor-
        
        
          tar, conter emoções e sentimentos
        
        
          que não cabem em outros lugares;
        
        
          nas decisões do dia-a-dia de um
        
        
          líder. Assim, proporcionalmente ao
        
        
          peso extraordinário do momento,
        
        
          não erapossível pensar nasminhas
        
        
          perguntas. Não seria digno agir as-
        
        
          sim.Sóqueriacompartilharcomele
        
        
          um instante de grande emoção.
        
        
          Osquadrospareciam interrogativos
        
        
          naquele instante. Por quê?Por quê?
        
        
          Por quê? Era a pergunta que cada
        
        
          umpareciadirigir-lhe. Porqueago-
        
        
          ra? Por que não esperar mais dois
        
        
          anos?Porquedaquelamaneira?Por
        
        
          que aquela existência? A força dos
        
        
          porquêsseperdeao longodenossas
        
        
          vidas. São pequenos filhos a quem
        
        
          temos que conquistar. Semmedos.
        
        
          Aliás, somos fascinados por nossos
        
        
          porquês. Eles são os alicerces de
        
        
          nossas conquistas. Mas depois,
        
        
          crescendoeenvelhecendo, écomo
        
        
          se esquecêssemos que – apesar de
        
        
          adultos–continuamosa ser filhose
        
        
          que os porquês são cada vezmais,
        
        
          decididamente, instigantes e
        
        
          desafiadores. Nunca tinha entrado
        
        
          naquela sala eo encontradodepé,
        
        
          em frente aos quadros. Em vez de
        
        
          parecer-me em busca de uma
        
        
          nostálgicaprocurapelos fragmentos
        
        
          do passado, deu-me a nítida
        
        
          sensação que estivera, sim, à
        
        
          procura de alívio para a dolorida
        
        
          via-crúcis dos porquês.
        
        
          Entrei. José Carlos logo percebeu
        
        
          minha presença. Não ficou surpre-
        
        
          so. Estendeu amão, recebeu-me e
        
        
          disse-meque ficasseao ladodelee
        
        
          comentou:
        
        
          “Catelli, este vemdaMongólia. Es-
        
        
          tive láquandoainda só tinhamban-
        
        
          deirasvermelhasemilitaresnas ruas
        
        
          congeladas deUlambator.” “Como
        
        
          deveria serperigoso fazer–naquela
        
        
          época–negóciosnaquelespaíses”,
        
        
          dissepara iniciar a conversa. “Peri-
        
        
          goso é o Rio de Janeiro de hoje. A
        
        
          Mongólia é rica em recursos natu-
        
        
          raisesabia– jánaquele tempo–viver
        
        
          em comunidade e com respeito aos
        
        
          recursos que elapossuía; oquenão
        
        
          é verdade emnossa cidade.”
        
        
          Como sempre, tinha uma lição de
        
        
          vida ame esperar. Estava ali, diante
        
        
          demim,ovelho sábioqueassumeo
        
        
          papel de formador. E eu, como alu-
        
        
          no,ansiavaporconheceroscritérios
        
        
          da relação e aonde levaria aquela
        
        
          conversa. Convidou-me a sentar no
        
        
          largosofá.Eraaprimeiravez,depois
        
        
          de tantos anos juntos, que nossa
        
        
          conversapodia ter lugaremumoutro
        
        
          contextoquenãoàmesade trabalho
        
        
          dele. Sinal de um evento extraor-
        
        
          dinário como efetivamente deveria
        
        
          ser o ultimo dia. Ofereceu-me um
        
        
          drinqueealgumascastanhasdecaju.
        
        
          Aparentemente relaxado, agia com
        
        
          outra velocidade, com outro ritmo
        
        
          em relação aode costume.
        
        
          “Sabe do que tenho certeza em re-
        
        
          lação ao amanhã?”  – Não, disse
        
        
          ainda um pouco constrangido pelo
        
        
          novo jeito da conversa. “Sei –
        
        
          continuou–queo telefonevai parar
        
        
          de tocar. Que perderei um dos
        
        
          sobrenomes. E aí, passarão àminha
        
        
          frente todas as fraldas domeu filho
        
        
          que deixei de trocar em nome do
        
        
          objetivo de cada ano, mais desafia-
        
        
          dor e de – apesar de tudo – teria de
        
        
          ser atingido.” Não precisei falar. Só
        
        
          omeu olhar interessado e compre-
        
        
          ensivo foi suficiente para que José
        
        
          Carlos, normalmente considerado
        
        
          poucoeloqüente, iniciasseuma lon-
        
        
          ga reflexão sobre omomento.
        
        
          “Emmeu primeiro ano como presi-
        
        
          dente a companhia valia dezoito