Julho_2002 - page 19

Revista daESPM – Julho/Agosto de 2002
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1– Introdução
Atualmente, a mídia tem destacado
uma série de reportagens e artigos que
envolvem o tema "social". Revistas de
negócios, sobretudo a mais importante
delas (revista
Exame
), têmdedicado arti-
goseatémesmoaconfecçãodesuplemen-
tos especiais para tratar o tema.Um caso
específicoéoGuiadaEmpresaCidadã.
A rádio CBN, talvez a mais impor-
tante emissora dedicada à notícia, cujo
público-alvo é composto por empresá-
rioseexecutivos (principalmente),criou,
recentemente, inserções na sua progra-
maçãopara revelar açõesdesenvolvidas
por determinadas empresas com o dito
caráter social.
Comumentesevêemartigose repor-
tagensnosdoismais importantes jornais
de negócios do país (
GazetaMercantil
e
Valor Econômico
), cuja temática está
voltadaparaachamadaaçãosocial, ação
cidadã ou qualquer outro jargão que se
queira utilizar.
A simples criação de um instituto,
cujo objetivo específico é determinar
parâmetros para as empresas interessa-
dasna responsabilidadesocial, por si só,
já demonstra que este assunto está na
ordem do dia das preocupações empre-
sariais.
Omeio acadêmico começa a discu-
tir essa temática.Os cursos de adminis-
traçãodeempresas, comoénatural ima-
ginar, carregam um tom pró-empresa e
defendem a inserção das organizações
privadas no cenário social. Há visões
mais neutras, como é o caso dos adep-
tos da corrente do economista Milton
Friedman, quedefendemqueaempresa
já participa ativamente no campo soci-
al, via geração de empregos e recolhi-
mento de impostos. No terreno das Ci-
ênciasSociais, sepoderãoencontrarvi-
sões que percorrem uma ponte de opi-
niões e visões sobre o assunto.
Vale recordar que a idéia de colabo-
ração mais efetiva da empresa com te-
mas ligados à área social não é nenhu-
ma novidade. Robert Owen (1773-
1858), sociólogo inglês, casou-se com
uma mulher muito rica e se tornou um
próspero industrial. Owen acreditava
numa relaçãomais solidária entre o ca-
pital e trabalho.Assim, aplicoualgumas
idéiasnas empresasqueelepassouadi-
rigir.Dentre as principais, destacam-se:
•Diminuiçãoda jornadadiáriade tra-
balho para dez horas;
•Aumento nominal dos salários;
• Implantaçãode creches, hospitais e
escolas para os filhos dos funcionários.
O resultado foi um crescimento ex-
traordinário dos lucros, além de suas
empresas passarem a se tornar um
referencial para a legislação social. Sa-
tisfeito comos resultados,Owen come-
çouapregar acriaçãodeuma sociedade
comunistacomo fimdapropriedadepri-
vada, oque provocou a ira da aristocra-
cia inglesa,queobaniudaGrã-Bretanha.
Viajou para os Estados Unidos, onde
fundouacidadedeNewHarmony.Anos
mais tarde, em seu regresso à Inglater-
ra, viu suas cooperativas falidas. Owen
preocupou-secomascondiçõesdesuma-
nasdos trabalhadoresbemcomoaspers-
pectivas futuras da relação capital e tra-
balho. Sua crençabaseava-sena impos-
sibilidade de se formar uma pessoa su-
periornumsistemaegoístaeexplorador,
como era o capitalismo daquela época.
Talvez,novamente, estejaacontecen-
doumaconfusãocomconceitos.Oprin-
cipal deles, seguramente, talvez seja o
epicentrodadiscussão: social. Issopor-
que, via de regra, o que muitas empre-
sas estão realizando efetivamente fatos
ligados a uma política assistencialista.
Louvável do ponto de vista da
filantropia, o assistencialismo, por ou-
tro lado, cometeumacomodamento for-
çadodasefetivasaçõessociais, tal como
define MAXWEBER (1994:13):
“a
ação social (incluindoomissãoou tole-
rância) orienta-se pelo comportamento
deoutros, sejaestepassado, presenteou
esperado como futuro (vingança por
ataques anteriores, defesa contra ata-
ques presentes ou medidas de defesa
paraenfrentarataques futuros).Os ‘ou-
tros’podem ser indivíduoseconhecidos
ouumamultiplicidade indeterminadade
pessoas completamente desconhecidas
(‘dinheiro’, por exemplo, significa um
bem destinado à troca, que o agente
aceitanoatoda troca, porque suaação
está orientada pela expectativa de que
muitos outros, porém desconhecidos e
emnúmero indeterminado, estarãodis-
postosaaceitá-lo também, por suapar-
te, num ato de troca futuro)”.
O assistencialismo defendido como
pano de fundo das campanhas da em-
presa solidária podemmascarar o ver-
dadeiro motivo que move a cabeça de
empresários, que é a própria contenção
dapopulaçãomais humilde e, viade re-
gra,maisexplorada.Weber, tal comoex-
postoacima, ensinaqueaçãosocial éum
movimento de grupos com interesses
bemdefinidos.Nessecontexto, então, a
ação social, paradoxalmente, de acordo
comumadefinição consistente e cientí-
fica, éaquela realizadapelosgruposem-
presariais, umavezque têmum fimcla-
ro e objetivo.
Para não perder um clima favorável
como o do momento presente, muitos
doschamados“marqueteiros”burilaram
um termoparaencaixarasempresasque,
teoricamente, preocupam-se com a
temática: omarketing social.
Mas, então, como sustentar omaior
motedacampanhadaempresa solidária
num cenário como este: a solidarieda-
“Taistentativas
sãoexibidascomo
umaverdadeira
panacéia, istoé,
um remédio
contratodosos
males.”
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