Maio_2005 - page 44

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REV I STA DA ESPM–
S E T EMB RO
/
OU T U B RO
D E
2005
americanos,queempregamimigrantes
ilegais, são cúmplices. Mas aquele
império vai decair, porque não têm
controle sobre tudoque sedesenrola
no mundo. Não têm nem controle
sobreoálcool, quenão sabem fazer.
Eu até deploro. Inclusive queria ser
comunistaquandojovem,eoPCBnão
admitia terrorismo, era tabu. Fuzilar
capitalista,sim;enforcaressecanalha,
sim.Mas terrorismonão.Oconceito
de soberania já foi paraoespaço, há
muito tempo. Nós temos soberania
relativa, tãodébilquantoa soberania
do Iraque.ÉsóoBushquererarranjar
umpretexto,queanossasoberaniavai
paraacucuia,comotalvezestejaindo
aAmazônia... Fico constrangido, ao
ver ônibus explodir emMadri ou
Londres. É um horror, mas é um
inimigo.Elesentraramno Iraqueena
Bósnia e fizeram a mesma coisa:
bombardearam hospitais, escolas,
mataram inocentes, crianças.Oque
ele espera?Que apareça um sujeito
comuniformedaAlQaedaediga:“Eu
souoministrodaguerradaQaedae
estouprocurandooministrodaguerra
britânico” para dizer “estamos
declarando guerra a vocês e
enviaremosnossosmísseis”.Elesnão
têmmísseis,não têm forçaaérea; têm
malucos que vão para o céu para
desfrutar não sei de quantas mil
virgens, e vão mesmo, porque
ninguémtiradacabeçadelesquenão.
As mulheres deles não querem se
libertardaopressão,queévistapelas
americanas,mas talveznãopor elas.
SeumônibusexplodeemLondres,é
umatragédia.Échatodizerissoporque
parece que estou torcendo para os
americanos.Tenhoestimaeafetopela
culturaamericana.Conheçoopapel
dos Estados Unidos na formação da
cultura política, a importância da
revoluçãoamericanade77.Conheço
tudo isso. Os pais da pátria, James
Madison, Thomas Jefferson etc. Sei
tudo que os Estados Unidos fizeram
pela humanidade, desde a lua até a
curadedoenças.Nãosetratadeódio;
masdeuma realidade.Ascoisasnão
sãomais comoelespensam.Nãohá
maisgeneraisparadeclararaguerra.
Jamais vi algo tãohorroroso como a
explosãodas torres.Masalguémestá
falando,porexemplo, sobreumadas
maiores riquezas da humanidade –
quenãodevenemexistirmais–que
estava nomuseu de Bagdá? Era um
museu dos mais ricos. Agora, está
pilhado,bombardeado,saqueado.Vai-
seconstruirumnovo Iraque?Nunca.
JR
–Vocêagoraestá falandodeuma
dificuldade de percepção, por parte
exatamente de quem fala a língua
dominante.Apesardisso,estãoilhados
nummardeincompreensão.Quando
vocêfaladasuaafinidadecomopovo
americano, faz-me lembrar de um
ídoloque temos emcomum, que foi
MonteiroLobato.Eletalveztenhasido
omaior escritor de literatura infantil
de todos os tempos. Só que era
brasileiroeescreviaemportuguês,nos
anos 30 e 40. Se não somos impor-
tantes no mundo, naquela época,
éramos ainda menos. Ele não foi
traduzido; só para o espanhol, na
Argentina. Os argentinos adoram
Lobatoatéhoje.Éumaperda.Quem
acabou tendo influência foiDisney–
eeleévazio.
JOÃO
–Écomoestavadizendo.Essa
editora francesa – com capas ele-
gantes,sofisticadas–foicompradapor
umamulti,que transformouaeditora
emumasimplescoleção,daqual faz
parte o livro da Brigitte Bardot,
“ProtejaasFocas”!
JR
– O que se perde nisso é a
diversidade. Se continuarmos
sofrendoessemassacredamídia,do
domíniododiscursopelospaísesque
têm o idioma hegemônico, muita
coisavai-seperder.
JOÃO
– O idioma não é mais
hegemônico. O inglês também está
passandoporumametástasequalquer.
JR
–Falamosdaexpressãoeestamos
nos pegando à palavra escrita, ao
livro.Seráque,daquia200anos,vai
haverlivro?Nãoevoluiráalgumoutro
sistema para as pessoas se
comunicarem?
JOÃO
–Quemsabeondeestaremos
daqui a200anos?Não sei.
JR
– Seoplanetanão acabar, oque
dizemos hoje será ouvido, daqui a
200 anos, da mesma forma que
ouvimos o que nos disseram os
pensadores como Seneca, quemeu
pai liamuito,eerade2.000milanos
atrás. Euestouentrandona idadede
lerSeneca.
JOÃO
–Masvocênão leráoSeneca
quesepode terperdido.O incêndio
dabibliotecadeAlexandriapode ter
levado com eledezenas dePlatões
de quem jamais ouviremos. Mal
sabemos a nossa história recente,
nem se vamos estar aqui como
espécie. Talvez o mundo seja
herdadopelo seu sermais antigo, a
periplaneta americana
– ou seja, a
nossabaratinha...
“O ESPANHOL SE TORNARÁA LÍNGUA DOMINANTE
NOS ESTADOS UNIDOS.”
ES
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