Julho_2002 - page 106

Revista daESPM – Julho/Agosto de 2002
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foi outraaçãoque trouxe transparên-
cia e mais confiança na relação com
os acionistas. Enfim, nomundo todo,
as universidades, as escolas de negó-
cios, estão voltando a falar de ética
como uma questão central porque
estamos vivendo o ápice do descrédi-
to. Por tudo isso, acho que a respon-
sabilidade social é estratégica não só
para os resultados da empresa como
para a sua própria sobrevivência.
FG – O fenômeno que nós, da co-
municaçãocomomercado, jápercebe-
mos hámuito tempo é a convergência
de duas imagens – a imagem
institucional corporativaea imagemda
marca.NocasodaNatura, pode-se, em
princípio, identificar duas formas de
comunicação que vocês transmitem
continuamente ao mercado – Natura
comoempresa, instituiçãoeNaturasob
a formade produtos.Na verdade, cada
vez mais, essas duas imagens conver-
gem. Nãohámais – como alguns anos
atrás – a possibilidade do consumidor
detectar e as considerar isoladamente.
É evidente que, nesse caso, a imagem
da Natura como empresa ética, como
empresa integradanacomunidade,aju-
daa reforçar a imagemdemarca.Você
concorda com isso?
Guilherme–Concordo totalmente
e acho que mais e mais as empresas
percebem essa conexão.Asmarcadas
virtuais, criadas donada, desvincula-
das de um comportamento corpo-
rativo tendem a ter uma consistência
cada dia mais duvidosa. O exemplo
clássico da Nike tendo seus produtos
boicotados por conta de seus proces-
sos industriais globalizados que não
davam conta de evitar o uso de mão
de obra infantil é confirmador desta
tendência.
SérgioEsteves– Essaconvergência,
no caso daNatura, é possível, por uma
razãomuitoclara.OGuilherme,hápou-
co,faloudosindicadoresdeperformance
queajudamaempresaasemovernoseu
processodegestão.Dentrodocampoda
responsabilidadesocialcorporativa,no
planointernacional,consideram-setrês
tipos integradosde indicadores:econô-
micos, sociais e ecológicos. Não como
eventosouperspectivasseparadas,mas
comoumconjuntoquerepresentaaem-
presa em sua totalidade. Esses indica-
dores são conhecidos como o “triple
bottom line”das empresas.Nocasoda
Natura, eles têm o que nós chamamos
naAMCEde “triple first line”–oque
significa dizer: aNatura tem um con-
junto de crenças e valores que funcio-
namcomopremissaseque,depois,dão
sentidoaos resultados colhidos através
dos indicadores. No casodeles, nãohá
uma esquizofrenia entre a identidade
corporativaeosresultadoscolhidoscom
a aplicação dos indicadores.ANatura
tem, então, a responsabilidade social
corporativa comoum elementode sua
estratégiadenegócios.Emoutraspala-
vras,elestêmlegitimidadejuntoaosseus
diferentespúblicosparaestabelecerem
quedireçãoseguirapartirdoscenários
mostradospelos indicadores.Essacon-
vergênciada imagem corporativa com
a imagemdemarca será semprepossí-
velquantomaisessasduasperspectivas
–princípios, valorese indicadores– fo-
rem convergentes.
FG– Issoé realmentemuito impor-
tante, Sérgio. Nem sempre as pessoas
que cuidamdagestãodas empresas es-
tãopreparadas paraperceber essas su-
tilezas.Quero fazerumaoutrapergun-
taaoGuilherme.Écaroconseguir tudo
isso?Você gasta mais do que gastaria
se tivesseuma filosofiamais pragmáti-
ca, mais objetiva, menos preocupada
com o ético e o social?
Guilherme – Depende muito da
abordagem e da estratégia. Mas, se
não tivéssemos realizado os investi-
mentospara expressaranossa identi-
dade como empresa que privilegia a
sustentabilidade e a responsabilidade
corporativa, sequer estaríamos aqui
conversando, porque seríamos uma
empresa inexpressiva, ainda próxima
do fundo de quintal onde nascemos.
Não tenhodúvidasdequea ética foi a
grande propulsora do nosso sucesso
empresarial e econômico. Em alguns
momentos, especificamente, issopode
significar maiores custos ou investi-
mentos, mas nossa convicção, su-
portada pela performance de al-
guns índices como o Down Jones
Sunstainability Index apontam que o
retorno é compensador. Lembro-me,
quando estávamos, em 1998, partici-
pando do lançamento do Instituto
Ethoseumaredede televisãonoscon-
vidouparaumaconversasobreaques-
tãodaresponsabilidade social empre-
sarial. Num dadomomento, o jorna-
listaquestionouseesse tema teriasen-
tido nomeio de tantas empresas bra-
sileiras que lutavam pela sobrevivên-
cia.Eurespondi queéa solidariedade
que aumenta as chances de cada um
dos indivíduos sobreviver. Se você
acha que é o individualismo que au-
menta as suas chances de sobrevivên-
cia, estamos emcamposopostos.Uma
competiçãoquenãoaceitea solidarie-
dade como elemento constitutivo da
sociedade, paramim, é absolutamen-
te perniciosa. Então, às vezes, custa
caro, mas tenho certeza de que o re-
torno é extremamente compensador,
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