Maio_2009 - page 12

Entrevista
R e v i s t a d a E S P M –
maio
/
junho
de
2009
12
Gracioso –Dr. João, a próxima
Revistavai tercomo temaumaper-
gunta:Existerealmenteouexistirá,
um dia, ummundo só? Quando
pensamosementrevistá-lo,pensa-
mosnasagadoDr. JoãoHavelange
naFIFA–osenhorassumiuaentida-
deem1974,quandopoucoounada
se falava ainda de globalização, e,
entretanto, o seu trabalhona FIFA
foinestadireção:unirospovospor
meiodoesporte.
JoãoHavelange – Isso mesmo.
Fico feliz e agradeço por esta obser-
vaçãoeconceito.
Gracioso – O Sr. acredita que
realizouoseusonho,eletornou-se
definitivo–ouvaidarparatrásjunto
comestacrisequeestáprovocando
reações de ódio aos imigrantes,
xenofobia, protecionismo. Neste
novo ambiente, o futebol poderá
serumaexceção?
JoãoHavelange – Em primeiro
lugar, estou feliz de recebê-los. O
tema é apaixonante e lhe agradeço.
Naprimeiraparte–que seriaaunifi-
caçãodomundo– tenhoumprimeiro
pensamento a externar, e não sei se
vocêsconcordarãocomigo.Comece-
mospelosEstadosUnidos.OsEstados
Unidosqueédaquele tamanho,com
300milhõesdehabitantes, ao ladoo
Canadá,queéodobro,masametade
égelo,hoje só tem30milhõese logo
abaixo oMéxico. Possivelmente até
o final deste século ou no início do
outro, tenho a impressão de que os
trêspaíses se tornarãoumúnicopaís.
Outroaspecto:oPacíficoeoAtlântico
–essespaíses têmportosdeum ladoe
dooutro–oquemuitagente,àsvezes,
esquece.UmdosproblemasdoBrasil
équenão temossaídaparaoPacífico;
se tivéssemos,pode tercertezadeque
o nosso desenvolvimento teria sido
mais intenso, mas estamos bloquea-
dos pela Cordilheira dos Andes – se
podemos dizer assim – ou porque
nunca nos aventuramos em con-
quistar algo de alguém, respeitamos
sempre; mas falta-nos uma saída no
Pacífico.Evejaoquerepresenta:oCa-
nadá tem, oMéxico temdeum lado
edeoutroháespaçoparaumbilhão
de pessoas. Uma coisa que chama
atenção nos EUA é que o homem
da Califórnia raciocina diferente do
homemdoAtlântico, daCostaLeste;
sãopensamentosdeamericanos,mas
são diferentes. Voltando ao tema do
futebol, quando cheguei à FIFA, ela
era totalmente dominada pelos eu-
ropeus, por razões simples: primeiro
nãohaviarecursos,asedeera lá,você
pegavaumTGV, umaviãoeemuma
horaemeiaestavaem todosos luga-
res;maseu,quando iaàFIFA, tinhade
enfrentar13horasdevoo, entãoveja
adiferença.Poroutro lado,oeuropeu
jáseacostumou–hojeemdia,coma
unidadeeuropeia, sãovinteepoucos
países (comose fosseoBrasilcom27
estados).Sãoraças,religiõeseculturas
totalmentediferentes,masumnão se
entrosacomooutro. Eomeupaís é
um exemplo, foi esse exemplo que
eu levei para omundo. Aqui temos
onegro,omulato,obranco,o japo-
nês... Amesma coisa nas religiões,
todas elas ecom issoas culturas. Eu
nasci comumpensamentodiferente
do sujeitoqueé só inglês, só francês
ou só alemão.
JRWP – O senhor nasceu no
Brasil?
JoãoHavelange –Bem aqui ao
lado, naRua dosOurives, que hoje
se chamaMiguel Couto.
JRWP–Cariocadagema.
João Havelange – Exatamente. É só
atravessar a rua, esquina de Miguel
Couto com Alfândega, bem perto.
Meu pai morava no segundo andar
– antigamente se morava no Centro
– depois é que foram aparecendo
os bairros.Meu pai chegou aqui em
1913eeunasci em1916; no segun-
do andar ficava a residência dele,
noprimeiroo escritório e embaixo a
loja de exposição do que ele repre-
sentava. Aqui, estou bem próximo e
pudesentir–estevalorqueadquiride
estar em contato com as raças, com
as religiõeseasculturas.Chegandoà
FIFA – perdoem-me a falsamodéstia
–mas achoque souoúnicohomem
nomundo que visitou 186 países. A
FIFA tinha187filiados; sónão fui ao
Afeganistãoporqueoaviãonãodescia
– o país vivia em guerra permanen-
te – fui a todos e o país que menos
visitei, visitei pelomenos três vezes.
Na FIFA, fizmais de20mil horas de
avião e – naCBD – pelomenos sete
mil. Não se pode mais ser adminis-
trador sentado na cadeira; é preciso
estar em contato comomundo todo
para saber comoascoisasevolueme
como semodificam; livros sãomuito
importantes,masémelhorsentir,eeu
senti. Nessa aproximação vê-se que
todos desejam uma evolução, e nós
somente estamos começando a ter
relaçõescomomundo.Administrati-
vamente,politicamentee tambémsob
oaspectodeexportação–estamosex-
portandomuitomais–queéum fator
importante.ComoeuvinhadoBrasil,
conhecia todasasraças–ohomemda
África, o homem árabe, eu conheci,
pois em São Paulo temos quase dois
milhões de libaneses; o japonês, que
foi uma das primeiras imigrações
que aqui tivemos a partir de 1896; e
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