Maio_2009 - page 42

Entrevista
R e v i s t a d a E S P M –
maio
/
junho
de
2009
42
mularde forma ilimitada,nomaisbreve
tempo possível, com um investimento
menorpossível.Chegamosaessaúltima
trincheira: o capital não tem condições
deseautorreproduzir;oslimitesdaTerra,
nomeumododever, sãoos limitesdo
capital.Nãodápara“refundar”ocapital,
que é uma das teses de hoje. São três
grandes projetos que estão em jogo: o
neocapitalismo, que, de certamaneira,
propõe uma produção commenos di-
óxidodecarbono; aquiloqueAlGore,
juntocomoSecretáriodaONU,propôs
deformaoficialefoipublicadona
Folha
de S. Paulo
– oCrescimentoVerde – a
lógicadocrescimentoemqueaprimeira
consideração émanter a vitalidade do
planeta e criar um desenvolvimento
adequadoaosrecursosdosecossistemas;
eoterceiro–umgrandemodelo–queé
oecossocialismo, que sepropõe incor-
porar, de forma substancial, um tipode
produçãodentrodos ritmosdoplaneta,
dosritmosdanaturezaeassimgarantaa
sustentabilidadedosistema,queaindaé
vítimada ideologiadodesenvolvimento
que,nasuavoracidade,nãoconhece li-
mites.Achoqueahumanidadeestácon-
frontadaaumagrandedecisão.Tenhoa
mesmaopiniãodePaulKrugman,Prêmio
Nobeldeeconomiadoanopassado,que
disseque “os próximosmeses serãoos
mais importantesde todaahistóriados
EstadosUnidos epossivelmentedahu-
manidade”porquenãopodemoserrar;se
errarmospodemosconhecerdevastações
que jamais foramvistasna faceda terra,
temos de acertar. Então, temos de criar
uma nova economia que englobe o
sistemadavida,acomunidadedevida;
superar o antropocentrismo: não só os
sereshumanos,mas tambémasárvores,
os animais, a cadeia da vida da qual
somos interligados e ecodependentes.
Simultaneamente, temos de produzir
umaeconomiasuficienteparaatenderàs
demandashumanas;nãopodeseruma
economiade acumulaçãode riquezas,
tem de ser uma economia suficiente,
decenteparatodososseresvivos–espe-
cialmenteoshumanos–oqueexigecerta
centralidade, uma governança global
paraquenãohaja sobreposições eque
não seexcluaninguém.Quehajauma
consciênciadeque só temosumacasa
para morar, pequena e velha. Dizem
os cosmólogos, se estabelecermos 100
anoscomoa idadedeum idoso,aTerra
teriaentre85e90anos; ela tempouca
imunidade interna, éumplanetavelho,
um prédio desgastado com recursos
limitados e superpopulação. Temos de
considerar os limitesdoplanetaeorga-
nizar,dentrodesseslimites,nãoumoutro
mundomas aquelemundo necessário
para podermos garantir nosso futuro e
o futurode
Gaia
, da casa comum. Isso
exigeuma governança global.Talvezo
núcleo fundamental dessa governança
seja oG20 –mas talvez não sejam os
governantes,mas os representantes dos
povos. Os representantes dos povos
devem escolher os seus representantes
–nãoos governos, que sempreestãoà
mercêde interesses.
JRWP – Como fazer com que essas
coisas aconteçam? Ao falar de uma
governançavocê, decerta forma, está
falandodeumpodercentral.
Gracioso – Falando em poder
central, ocorre-me uma comparação:
nahistória, a forçadominante sempre
procurou justificativas, sempre pro-
curou valorizar-se por um respaldo
espiritual–foiassimnaGrécia,naÍndia,
emRoma,emtodosasculturasantigas,
o Santo Império RomanoGermânico
também foi buscar abençãodoPapa.
E,entretanto,nasuaexplanaçãolúcida
doque seriaa solução, vocênão falou
emforçareligiosaouforçamoral.Você
nãoacreditaque istotenhaumpapela
desempenhar na direçãodos destinos
dahumanidade,no futuro?
Leonardo –Pensoque a grande re-
volução–quepoderácriar aatmosfera
deumconsensomínimoentreospovos
–nãoéumvalorpolítico,nemeconômi-
co,nem ideológico:éumacoligaçãode
forçasaoredordealgunsvalores(queeu
chamariaValores Infinitos) eque sãoos
valoresdasolidariedade,dacompaixão,
doamor,dacooperação,quepermitem
aossereshumanosconviveremenãose
devorarem.Equesãoabasedesustenta-
çãodequalquer sociedade,que secris-
talizaemleis,normas;masque,portrás,
existeessesenso,queossereshumanos
têm, de serminimamentecooperativos
porque são animais sociais. Isso só
triunfa, não por leis e normas – que
funcionam como imperativos categó-
ricos, repressores –mas por uma aura
de espiritualidade, de sentidode vida,
depertencer aalgomaior queéahu-
manidade,oPlanetaTerra,oUniverso.
Essapercepçãoestámuitopresentenos
povos originários – nos indígenas – e
quenósperdemos.
Gracioso–Estámaisfortenospovos
doOriente.
Leonardo – Os povos doOriente
têm como natural a tradição taoísta,
a tradição budista do hinduísmo, eles
sentem-separtedouniversoe,decerta
maneira – apesar das profundas desi-
gualdades epobreza– sentem-semais
integrados ao universo; são religiões
mais humanitárias que as ocidentais,
extremamente beligerantes, especial-
menteatradiçãoabrahâmicadejudeus,
cristãos e muçulmanos; são religiões
guerreiras, porque vivem domito tri-
balista de ser “povo escolhido”, como
Bushtraduziu:“opovoescolhidosomos
nós,odestinomanifesto,quedevemos
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