RESPM MAI_JUN 2016
entrevista | Beatriz Martins Carneiro Revista da ESPM |maio/junhode 2016 102 ação no meio internacional às vezes mais arrojada do que internamente. Nós somos signatários de várias con- venções e às vezes demora um pouco para internalizarmos essas resolu- ções. A Lei Anticorrupção é recente e traz esses compromissos que já ha- viam sido assumidos. Ela é um grande passo. É claro que sempre há espaço para aperfeiçoamentos, mas o que falta mesmo é mais divulgação dessa lei. É torná-la pública. Normalmente, essa é uma medida que o governo tem muita dificuldade em tomar. O Pacto tenta suprir um pouco esta dificulda- de, trazendo a público e para a Rede Brasil essas informações. Revista da ESPM — Não existe cor- rupto sem corruptor e no Brasil vemos uma distinção clara da ação da Justiça na avaliação de réus do serviço público e da iniciativa privada. Salvo exceções, no Mensalão e na Lava-Jato, os operadores do mercado tiveram penas muito mais elevadas e menos atenuantes do que as autoridades do Congresso ou do Execu- tivo. Que consequência isso trará para o avanço damoralidade e da ética no país? Beatriz — Estamos vivendo um mo- mento histórico de mudança nessa relação. Há dez anos, estaríamos falando justamente o oposto: nos processos de corrupção só se punia o funcionário público ou o político. E esta é uma relação de duas partes que envolvem os agentes públicos e privados e pode ser estendida aos CEOs e CFOs das organizações. Eu concordo com você. Talvez a balança esteja pendendo para o outro lado, na busca de um equilíbrio natural. Agora, é muito importante comentar que a corrupção, às vezes, é enxerga- da de forma muito reduzida da sua real dimensão. Acabamos falando em dinheiro, mas a corrupção é na verdade um empecilho para o desen- volvimento econômico e social. Esse dinheiro mal usado deveria ir para finalidades relacionadas ao bem-es- tar da sociedade. Educação e saúde sofremmuito com a corrupção. Revista da ESPM — Qual deve ser o impacto da divulgação dos documentos da panamenha Mossack Fonseca? Os paraísos fiscais podem ser o próximo alvo de uma limpa no sistema ou este é um tema que incomodaria gente demais? Beatriz — Já existe uma iniciativa mundial neste sentido, que é o fato de os bancos terem de reportar aos países de origem os nomes das pes- soas que têm conta nessas institui- ções. É uma decisão que passa a valer a partir de 2018, advinda de uma busca por transparência. Principal- mente para se evitar toda a questão relacionada à lavagemde dinheiro. O problema não é o paraíso fiscal. Não é o caso de um país oferecer melho- res condições fiscais para manter o dinheiro lá. O problema é a identifi- cação das pessoas que buscam isso e o porquê. Revista da ESPM —Quais são os países, regiões ou setores econômicos que mais preocupam o Pacto Global no que se referem às práticas contumazes de cor- rupção nos negócios? Beatriz — América Latina, Ásia e Áfri- ca. Estes são os locais onde estão os maiores focos de preocupação. No se- gundo semestre, vamos começar um programa específico sobre este tema juntocomoPactoGlobal deNovaYork. Esta é uma iniciativa que está sendo promovida em quatro países: dois da África, umdaÁsia enoBrasil. Revista da ESPM — A Inglaterra pro- moveu recentemente o Anti-Corruption Summit: London 2016, um seminário sobre corrupção pública e empresarial, liderado pelo governo inglês. Mas até que ponto um determinado governo, seja ele qual for, tem força moral e ética para dis- cutir o comportamento de outros países? Beatriz — Governos e entidades têm papéis complementares nessa questão. Aqui, a Controladoria Geral da União (CGU) — atual Ministério da Transparência, Fiscalização e Controle — tem cumprido um papel importante. Nós temos uma parce- ria com eles, que já fizeram o nosso treinamento em duas ocasiões. A corrupção tem os dois lados e, por isso, essa troca é importante. E, nes- sa temática, o setor público não pode se omitir. A CGU tem sido uma refe- rência. Ainda assim, outros órgãos deveriam se envolver mais. Revista da ESPM — Quando se fala em compliance, o que vem à mente são fraudes contra o mercado, a necessidade da transparência financeira, a evasão de impostos ou o pagamento de propinas. Há empresas que assumiramseus erros, se retrataram, transformaram-se em benchmark e estão compartilhando sua experiência comoutras. Sãomotivode orgulhopara seus colaboradores
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