RESPM_MAR_ABR_2015 ALTA

entrevista | Daniel Kahneman Revista da ESPM |março/abril de 2015 52 Alexandre — Estamos lidando com uma crise econômica no Brasil, e a ideia desta entrevista é buscar insights da economia comportamental para tomar melhores decisões de negócios. Uma primeira pergunta é sobre a Teoria da perspectiva, que trata de decisões tomadas sob risco. Como a aversão a perdas compromete o pro- cesso de tomada de decisões — ainda mais em tempos de incerteza? Kahneman — De muitas maneiras. Eu não sei de que decisões você está falando, mas a aversão a perdas influencia quase tudo. Em geral, a aversão a perdas é uma força no sentido da paralisia. As desvanta- gens de fazer qualquer movimento pesam mais do que as vantagens. Em situações de crise, de incerteza elevada, os efeitos da aversão a perdas são exacerbados. Logo, fica ainda mais difícil tomar qualquer decisão em um período de incerte- zas elevadas. Alexandre — Olhando para o outro extremo, seus estudos mostram que líderes muito otimistas tendem a as- sumir riscos mais elevados. Existem medidas que as empresas possam tomar para evitar esse tipo de viés nas suas decisões em tempos de incerteza? Kahneman — Se é de um CEO que você está falando, então é respon- sabilidade do conselho checar as decisões tomadas por ele. Existem diversos procedimentos para fazer isso, mas o melhor, provavelmente, é o pré-mortem [em oposição ao post mortem , ou autópsia], que eu descre- vo no livro Rápido e devagar (Editora Objetiva, 2012). Nesse procedimen- to, você cria um mecanismo para considerar os modos como uma decisão pode dar errado. É uma boa técnica para controlar o otimismo. Existem outras, mas esta é a melhor. Alexandre — A ideia é olhar para o planejamento que estamos fazendo hoje como se estivéssemos um ano no futuro e o plano tivesse falhado. Este é o princípio? Kahneman — Sim, esta é a ideia. Alexandre — Qual é o insight por trás desse exercício? Kahneman — Tipicamente, à me- dida que uma decisão é tomada, instala-se a tendência de as pessoas se alinharem e não discutirem as objeções àquela decisão. Particular- mente, quando é uma decisão forte- mente apoiada pelo líder, pelo CEO. Ao criar uma situação de pré-mor- tem , você torna legítimo questionar a decisão, de um modo que frequen- temente não ocorre quando uma de- cisão é tomada ou está prestes a ser tomada. Logo, é uma legitimação da dúvida e do dissenso. O que ela faz é controlar o otimismo em alguma medida. Alexandre — No geral, existe algo que homens e mulheres de negócios possam fazer para melhorar sua habi- lidade de tomar decisões sob a pressão de uma crise econômica? Kahneman — Na verdade, não. O único pensamento que me vem à mente é o de que há situações nas quais é importante buscar aconse- lhamento. Isso é verdade na vida pessoal e funciona quando você tem de tomar decisões importan- tes. Existem períodos durante os quais as pessoas sentem que sua tomada de decisões não é tão boa quanto desejariam, seja porque elas andaram perdendo, porque se encontram em um estado emocio- nal ruim, ou por causa da incerte- za elevada. Aqui, a ideia de pedir conselhos, de desacelerar antes de tomar decisões, de se recolher, pode não ser ruim. Conheço gente que faz isso no mundo das finan- ças. Quando estão perdendo muito dinheiro, essas pessoas começam a agir segundo regras, em vez de se- guir seus instintos. Elas se tornam mais conservadoras, no sentido de não confiar demais em sua in- tuição. Aceitam mais conselhos e seguem mais regras. Alexandre — Será que essa lógica se aplica a estrategistas corporativos? Kahneman — Não sei se esse é um bom conselho de maneira geral. Eu me refiro às situações em que a pes- soa que toma as decisões sente que está perdendo o controle. Em geral, a aversão a perdas é uma força no sentido da paralisia. As desvantagens de fazer qualquer movimento pesammais do que as vantagens

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